O músico e produtor Nicolas Jaar esteve em quase todas as listas dos melhores de 2011, seja com seu álbum de estreia, Space Is Only Noise, seja com as apresentações chapantes de seu live com banda. Nascido em 1990, na cidade de Nova York, Jaar passou boa parte da infância morando em Santiago, no Chile, terra natal do pai. Logo que voltou para NY, Jaar começou a experimentar com softwares de produção musical. Aos 17 anos, já lançava algumas dessas composições pelo conceituado selo Wolf+Lamb. Agora, com apenas 22, é uma das grandes promessas da música eletrônica. Mas seu som vai muito além do que vem à mente da maioria das pessoas quando se fala desse gênero. Nesta conversa com a Soma, Nico fala sobre novos projetos, a vontade de colaborar com Mulatu Astatke, pirataria digital, novas tecnologias em distribuição de música, entre outros assuntos. E fique atento, porque dessa fonte ainda sairá muita novidade.
“Antes, quando eu ia atrás de música brasileira, era pra descobrir boas percussões e ritmos. Mas, quando ouvi Cartola, percebi como eu posso realmente me inspirar no sentido melódico. Tem muito sentimento e tem muito do que gosto no fado e na música africana. A voz dele junta essas duas coisas! Tudo isso me inspirou demais.”
Como começou a sua relação com música e produção?
Comecei a produzir minhas músicas quando tinha quatorze anos. Eu usava um programa chamado Reason, que era incrível em termos de fidelidade com o que dá pra fazer em um estúdio de verdade. Por exemplo, você tem um botão que ao ser usado te mostra todo o mapa de cabos e canais, e assim você basicamente vê como um estúdio completo pode ser simulado. Portanto, nessa relação de como funciona o analógico, o Reason é excelente e me ajudou a me aprofundar a parte técnica.
Muitos tentam rotular seu estilo e já vi diversas tentativas de defini-lo. Como você descreve a sua música? E de que maneira a vivência no Chile e NYC a influenciou?
Acho que eu prefiro não descrever a minha música. A verdade é que eu não estou tentando me encaixar em nenhum estilo, faço o que realmente gosto e me deixa à vontade. Eu acho que NYC e o Chile definitivamente me influenciam, só que mais em um nível biográfico do que musical.
“Eu não dou a mínima [para a pirataria]. O que importa pra mim é que as pessoas conheçam a minha música. Acho que é responsabilidade dos selos e dos artistas criarem produtos interessantes o suficiente para que as pessoas queiram comprá-los. É simples.”
Quais são suas principais influências e de que forma elas inspiram sua música?
Mulatu Astatke. Gostaria muito de colaborar com ele. Eu acho que nós poderíamos fazer algumas coisas bem legais juntos. Piro muito no Gonzales – produtor da Feist –, ele faz uns solos de piano que são realmente muito bonitos. O que eu quero dizer é que muitas coisas me inspiram, em estilos diferentes.
Percebe-se uma influência grande do hip-hop nas suas produções. Já passou pela sua cabeça criar um projeto caindo mais pra esse lado?
Sim, claro! Eu sempre quis produzir artistas de hip-hop. Na verdade, tive meu computador roubado mês passado, e tinha uns vinte beats muito bons nele. Infelizmente, perdi tudo. Eu te confesso que sempre experimento no hip-hop, mas é uma coisa que ainda não consegui lançar.
Você gosta de trabalhar em cima de clássicos, criando versões totalmente diferentes. Foi assim com “Billie Jean”, do Michael Jackson, “After Laughter Comes Tears”, da Wendy Rene, entre outros. É a sua maneira de aplicar suas influências em um som mais atual?
Até certo ponto, sim. Mas também é uma forma de tentar me divertir no estúdio, apenas fazendo música. Então pego sons que gosto de verdade, edito e crio remixes, por pura diversão. É muito simples.
Seus primeiros trabalhos saíram pela Wolf+Lamb e seu disco de estreia veio pela Circus Company, ambos selos ligados à música eletrônica contemporânea. O que fez você criar o seu próprio selo, Clown & Sunset?
A Clown & Sunset tem um espectro muito mais amplo. Eu posso lançar um disco de um fagotista de música clássica experimental, porque eu piro nisso também, ou uma compilação de tango argentino, sacou? Não estou interessado em lançar só um estilo musical, e também não quero fazer apenas um tipo de música. Então a Clown & Sunset foi apenas uma maneira pra eu dizer “beleza, eu quero fazer o que quiser, então só tem uma saída: ter um selo”. Se eu quiser fazer um disco de hip-hop, lanço por lá. Se eu estivesse na Wolf+Lamb ou na Circus Company, pra onde o meu hip-hop iria? Pra lugar nenhum…
Como funciona a pesquisa pra encontrar novos artistas que se encaixam nesse selo?
Até o momento a maioria são amigos e pessoas próximas de longa data. Fora isso, tenho uma equipe de A&R que escuta tudo. Nós ouvimos todas as demos e singles. Eu mandei uma demo que foi ouvida pela Wolf+Lamb e olha o que aconteceu! Acho que as demos ainda são uma coisa importante, à qual os selos devem dar atenção. Existem vários selos que não ouvem mais demos, e eu acho isso de uma arrogância e estupidez incrível, porque você pode estar perdendo muita coisa boa. Eu não consigo ouvir tudo, mas minha equipe ouve e faz seleções que são enviadas para mim.
Mais cedo você falou sobre novas tecnologias pra promover os lançamentos do Clown & Sunset. Pode adiantar mais sobre isso pra gente?
Sim, nossa primeira ideia foi com o uso de pendrives USB, que lançamos em 2011 pra uma compilação do selo. Fiz essas caixas fininhas de lata com um colar USB que continha uma compilação de dez faixas, bastante inspirada no hip-hop – chama-se Ines. Foi lançada logo depois do meu álbum e tinha músicas da Nikita Quasim e Soul Keita. Mas acabamos de criar um novo dispositivo e vamos começar a lançar músicas através dele. Já encomendamos mil cópias iniciais desse novo dispositivo, mas eu não posso falar muito sobre isso ainda. Aguardem e verão!
“Gravar vocal no quarto é perfeito, porque rende esse resultado: soa como um sample. Quando você está num grande estúdio, sua voz fica boa demais. Quando faz no seu quarto, com as caixas de som do computador, fica uma merda, mas fica com essa característica suja, antiga. Essa é a minha onda.”
Você pretende produzir outros artistas futuramente ou prefere uma coisa mais pessoal?
Sim, com certeza. Eu acho que isso vai acontecer algum dia. O principal problema é arrumar tempo necessário pra fazer direito. Já esta começando. Eu estou produzindo o Tiny Leg, mas não é um trabalho solo, tem cinco outros produtores da Clown & Sunset criando beats pra ele. E, como disse, eu perdi os meus 20 beats… (risos)
Quais as principais diferenças entre a sua apresentação live com banda e seu live como DJ solo?
A grande diferença é que, quando eu toco sozinho, faço um monte de coisas novas, que não tenho tempo de trabalhar com a banda. Leva um bom tempo de ensaio pra encaixar tudo da forma que eu quero. Eu também toco meus remixes, coisa que não faço com a banda.
Percebi na sua apresentação que as vozes e alguns fragmentos vocais de suas músicas é você mesmo que canta. Como começou essa história de usar sua própria voz nas tracks?
Você conhece o Jai Paul? Ele tem uma faixa incrível chamada “BTSTU”. É o tipo de vocal que eu realmente gosto de fazer. Soa como se fosse um sample, mas na verdade é a voz dele gravada com péssima qualidade. Isso você pode fazer sozinho, com qualquer microfone. Eu gosto disso. Por exemplo, gravar vocal no quarto é perfeito, porque rende esse resultado: soa como um sample. Quando você está num grande estúdio, sua voz fica boa demais. Quando você faz no seu quarto, com as caixas de som do computador, fica uma merda, mas fica com essa característica suja, antiga. Essa é a minha onda.
Você tem um novo projeto chamado Darkside, em parceria com Dave Harrington, certo? Vem disco de vocês? E disco novo do Nicolas Jaar, Sai em 2012?
O que posso adiantar basicamente é esse dispositivo que eu falei: deve sair em maio e trará uma compilação com artistas da Clown & Sunset, além de novas músicas minhas. E com certeza vamos lançar um álbum do Darkside em 2012.
Fale um pouco sobre o que você anda ouvindo de novidade no momento?
Como fã, eu não ouço muitas coisas novas. O que eu escuto de som atual é mais pra saber o que está acontecendo e ficar por dentro de novidades da música contemporânea.
Então fale cinco discos/músicas que realmente mexem com você:
Walk On By, do Isaac Hayes, The Koln Concert, um disco ao vivo do pianista Keith Jarrett, o primeiro vinil do Ricardo Villalobos pelo selo Perlon, Crooks and Lovers, do Mount Kimbie e Songs in a Room, do Leonard Cohen
Hoje nós fomos comprar discos de música brasileira e você se sentiu bem à vontade. O que você sabe sobre a nossa música e o que mais te interessa?
Antes, quando eu ia atrás de música brasileira, era pra descobrir boas percussões e ritmos. Mas, quando ouvi Cartola, percebi como eu posso realmente me inspirar no sentido melódico. Tem muito sentimento e tem muito do que gosto no fado e na música africana. A voz dele junta essas duas coisas! Tudo isso me inspirou demais.
O que você achou de suas apresentações no Brasil?
Eu achei o D-Edge bem legal, e o Warung é mais um clube de praia. Minha música não combina tanto com o clima praiano… Talvez até combine, mas não com esse tipo de praia (risos).
“Acabamos de criar um novo dispositivo e vamos começar a lançar músicas através dele. Já encomendamos mil cópias iniciais desse novo dispositivo, mas eu não posso falar muito sobre isso ainda. Aguardem e verão!”
Qual a sua opinião em relação aos downloads ilegais de sua obra na internet? No Brasil, por exemplo, grande parte das pessoas que conhecem o seu trabalho chegaram nele através desses downloads.
Eu não dou a mínima pra isso. O que importa pra mim é que as pessoas conheçam a minha música. Eu realmente não me importo. Acho que é responsabilidade dos selos e dos artistas criarem produtos interessantes o suficiente para que as pessoas queiram comprá-los. É simples.
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