São quase seis quilômetros e meio de selva de pedra que separam as estações São Bento e Santa Cruz, ambas localizadas na linha azul do metrô de São Paulo. Mas para o rap nacional, a distância entre as rodas de b-boys do largo de São Bento e a Batalha do Santa Cruz pode ser medida, sem tanta precisão, nos anos que separam os pioneiros dos anos 80 à “nova geração” dos 00.
Aproximar tantas distâncias é um trabalho que não pode ser feito sozinho, e para essa missão o patrão da Vila Arapuá Rappin Hood convocou o maestro do Cachoeira Emicida, para juntar “os moleque e os tiozinho” em “Da Estação São Bento ao Metrô Santa Cruz”.
A track, que deve entrar no próximo álbum do Mr. Hood, Sujeito Homem 3, conta com um beat balançante do saudoso DJ Primo, e abre com Juju Denden lembrando do grande festival comemorando os 300 anos de Zumbi em SP, realizado com mais de 50 mil pessoas na plateia (e com a sempre solícita polícia militar, como sempre, grampeando levianamente alguns rappers).
Nas rimas, Emicida abre lembrando os tempos que rachava um dog no terminal com a magra grana que arrecadava nas batalhas do começo da carreira – “a rua é nóis há mais de 20 anos, procura saber”, avisa –, pede benção às diferentes gerações, de Nelson Triunfo ao Pentágono, e se despede lembrando do “Duelo dos MCs, Liga dos MCs, Rinha dos MCs e Santa Cruz”.
Hood, por sua vez, leva o ouvinte prum rolê tão velha guarda que é bem possível que os fãs mais dente-de-leite do Emicida nunca tenham ouvido falar dos picos citados: casas como Neon, ASA de Pinheiros, Club House, Viola de Ouro, equipes de baile como Chic Show, Kaskatas e Zimbabwe, filmes como e .
Atentem – não há nem no som nem neste texto a ideia de ressentimento entre gerações. Num ano em que o hip hop tem ultrapassado tantas fronteiras e se tornado novamente a trilha sonora da juventude brasileira, o resgate dessa história ajuda a criar contexto para quem chega agora, colocando o “novo rap” num contínuo histórico orgulhoso de seu próprio passado.
Esses movimentos de se resgatar, ainda que lentamente, a história nem sempre linear do hip hop no Brasil (que depende muito ainda do registro oral) podem ser sentidos recentemente em diferentes pontos, dos ao livro , passando pela nossa lista de 25 sons para entender o rap nacional. Ao juntar, para contar essa mesma história, quem já foi, que tá aí faz tempo e que “acabou” de chegar, “Da Estação São Bento ao Metrô Santa Cruz” é um exemplo mais que completo de que passado e futuro não só podem como devem andar de mãos dadas.