Atentem, paulistanos ligados: Don L tá na área. O rapper cearense vem a São Paulo com uma missão especial – lançar o clipe da inédita “Sangue é Champanhe”, track que fará parte da mixtape Vida Premium Beta. O vídeo, de Autumn Sonnichsen e Erica Gonsales, só poderá ser visto na expo Paraíso na Boca, que abre neste sábado (22) na Ava Galeria.
Aproveitando o rolê, Don resolveu lançar mais algumas faixas de Caro Vapor, pra manter todo mundo instigado, com exclusividade aqui na Soma. A primeira é “1 Milhão de Histórias”, parceria certeira com o Emicida, e a outra é a quase canção “Depois das 3”, um soul-rap com participação de Izabel Shamylla, jovem talento de Fortaleza.
Segundo Don, Caro Vapor deve sair já em outubro, e além dos sons que vocês estão conhecendo agora, vai contar com inéditas como “Tão Difícil” – “essa é a minha ‘Juicy’”, diz o rapper, em referência ao hit de Notorious B.I.G.
Para além disso, Don ainda promete para breve uma segunda mixtape, a Vida Premium beta, uma pré-versão do álbum que ele quer fazer “do jeito certo, com os equipamentos certos”. Aproveitamos o rolê do Don por São Paulo para clicarmos ele sob a luz dos postes do MASP e trocarmos uma ideia sobre esses novos sons. Ouça (e baixe) as tracks e leia a entrevista logo abaixo.
Baixe os sons
Como nasceu “1 Milhão de Histórias”?
Foi louco. O Dario me passou um monte de beat. Eu escolhi um e ele falou “esse a Flora pegou”, e eu “puta que o pariu” (risos). Ela ainda não lançou, mas uma hora deve lançar, é um beat muito foda. Agora esse outro, que eu escolhi pra faixa, eu não entendia o que a mulher do sample falava no começo em inglês. Eu faço som assim, boto o beat pra rolar e vejo que sentimento me traz. Naquele caso foi “Um Milhão de Histórias” na cidade. Eu sou meio neurótico com flow e rima. Esse é um som que eu queria dar mais atenção na letra, porque o rap é uma briga sempre entre a letra e o flow. Eu só paro quando os dois entram em harmonia, a letra e o flow tem que ser bons. É por isso que eu demoro uma noite inteira pra fazer um som. Eu acabo às 5h da manhã. Nesse som eu fiz uma rima meio diferente, no primeiro verso principalmente. Dei mais privilégio à poesia. Eu fiz três versos e depois que eu estava com o refrão que eu descobri o que a mulher fala no começo, (cantarola) “all the kind of misery I find” e tem tudo a ver.
Que sample é aquele?
Não sei, o Dario que sabe, tenho que perguntar pra ele. Aí eu pensei, “esse som ia ser foda se o Emicida fizesse um verso nele”. O meu terceiro verso não tava muito legal, então eu tirei e mandei pro Emicida. Troquei uma ideia com ele, fazia tempo que eu falava pra ele que ia mandar um som, mas nunca deu certo. Ele demorou uns meses pra me entregar, mas mandou um verso muito foda.
E qual era a ideia por trás da letra?
Eu não planejo muito, “ah, vou fazer um som assim”. Nesse caso foi isso, uma letra que fala mais das coisas gerais e com menos storytelling. Mas esse som é sobre o preço. É uma coisa que eu gosto de falar e que nesse disco eu venho falando muito. São um milhão de coisas maravilhosas para você viver e experimentar, mas tudo tem um preço, “um milhão de tiros pra vitória”. E quando você consegue alcançar isso, às vezes vem como tempero, às vezes vem como peso. Pode ser uma coisa especial, mas também pode ser que você tenha que fazer determinadas coisas que não gostaria de ter feito. Eu queria colocar essa contradição na letra.
Don L por Fernando Martins Ferreira
E quando chegou a rima do Emicida, qual foi sua reação?
Foi foda, quebrou tudo. Eu sabia que ia vir bom. O Emicida é um dos poucos rappers brasileiros que eu confio em mandar um som que eu acho foda porque ele vai vir com um verso mais foda ainda, e eu mandei nessa intenção mesmo. Quando um MC faz um som com outro, sempre tem uma competição. Mas quando você tá seguro, “fiz um verso foda”, se o maluco fizer um verso mais foda é melhor ainda, porque o som vai ficar muito foda, e foi isso que aconteceu. Achei que eu introduzi o assunto – umas coisas precisavam ser ditas, e às vezes as coisas que precisam ser ditas são chatas. Como meu primeiro verso, que é mais poético, e o segundo é mais storytelling, do jeito que eu gosto. Então o Emicida podia chegar do jeito que ele quisesse na terceira estrofe, porque o papo tava dado.
E você nem mexeu no beat do Dario?
Eu mixei, né? Quis dar um som mais sujo, analógico – fiz isso simulado, que é como dá pra fazer no software. Mas acho que ficou bem louco esse som de voz valvulada no final.
Quem é a menina que canta em “Depois das 3”?
É a Izabel Shamylla. Ela cola lá no estúdio em que eu gravo. Eu fiz a letra e tinha uma melodia muito parecida com essa. Ela pegou e cantou do jeito que eu queria, mas também deu uma cara dela para o som. Ela está começando a carreira agora, ainda não tem nada definido artisticamente, canta em barzinho, MPB – mas agora ela está tentando fazer uma coisa mais voltada para a black music. Ela é muito nova, tem 17, 16 anos.
Don L por Fernando Martins Ferreira
Sério?
É. E a voz dela é muito original. Às vezes eu crio alguma coisa que eu não posso cantar, tipo esse blues que eu vou gravar aqui em São Paulo, “Doce Dose”. Eu queria um cara estilo Muddy Waters, aquela voz rasgadona, pra cantar. Eu fiquei procurando, porque eu não conheço quem faça isso. O que eu conheço de blues no Brasil é mais pro estilo inglês. Os caras não alopram na voz como os americanos fazem. Eu procurei na internet e encontrei o Big Chico, cantando “Hoochie Coochie Man” e pirei, porque ele canta de verdade, rasgando a voz. Nesse da Izabel foi a mesma coisa, eu queria uma coisa meio soul, um pouco Sade, Erykah Badu. Esse beat é do Billy Gringo é só um break clássico de bateria e o resto é tocado. Quem tocou foi o Pepeu, um maluco lá de Fortaleza, ele fez tudo na vibe mesmo – botou violão, guitarra, um baixo dum Korg que parece um baixo acústico. Ele tem muita manha. Depois eu botei o sax. O loop era muito vintage, clássico, e eu precisava deixar os instrumentos de um jeito clássico, e eu procurei fazer isso aí na mixagem.
Você não escreveu um rap aí, é uma canção.
Pois é, é uma canção. Esse som tinha um outro verso, além do refrão. Eu não tinha gostado do outro verso, e acabei deixando a música de lado. Um dia o Billy chegou pra mim e falou, “pô, não, esse som é foda, você tem que lançar esse som”. O refrão era foda, mas os versos não estavam legal. Reescrever um som é muito mais difícil do que fazer do zero, porque você tem que voltar naquela vibe. Um dia deu certo, mas aí eu quis fazer uma história de canção, porque foi a imagem que veio. Eu faço som através de imagem. Esse som me dava um clima de coisas que não vivi – aí eu falo de Ipanema em 70. Foi então que eu lembrei de “Alegria, Alegria”, do Caetano, e pensei, “pô, eu deveria fazer a minha versão disso”. E a minha versão é “a gente contempla um transatlântico, eu transo um som romântico, pornô meio transa tântrica”, uma coisa de jogar com as palavras. Ao mesmo tempo eu queria fazer um flow old school, meio Rakim, mas também queria fazer o Caetano cantando um rap (risos).